
Ditadura - No final dos anos 70 do século passado, os espaços de organização dos trabalhadores e dos movimentos sociais populares eram muito poucos. Os sindicatos, na maioria dos casos, eram dirigidos por homens de confiança do governo autoritário. As reuniões e atividades aconteciam, em geral, em locais cedidos pela Igreja Católica, com a autorização expressa de integrantes da hierarquia e com a participação ativa de padres e freiras. Minha opção militante, então, foi determinada pela prática cristã e católica. Isso contribuiu para que eu tenha uma visão libertadora da religiosidade, o que me afastou, naturalmente, de opções mais místicas e distantes da realidade. A participação política se tornou uma rotina na minha vida, e no cotidiano de muitas outras pessoas que iniciaram a caminhada naquela época conturbada. Na missa de sétimo dia por Marielle Franco e na ocupação de São Bernardo do Campo eu tive a chance de rever muitas pessoas que continuam na mesma trincheira de luta, ou seja, que mantém o compromisso com a transformação social de nosso país e do mundo.


Aprendizado - Com o passar do tempo, eu aprendi a respeitar as diferenças que existem, dentro da Igreja e no mundo, e a conviver com a diversidade, como pressupostos de convivência pacífica e democrática. O restabelecimento de algumas liberdades democráticas na sociedade, a retomada de sindicatos pelos trabalhadores e a criação de espaços de reunião abertos ao povo fizeram com que a Igreja Católica promovesse uma relativização da atenção com os trabalhadores e com as classes populares. Minha opção pessoal, então, se tornou uma escolha militante mais explícita. Participei da fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e me filiei ao Partido dos Trabalhadores (PT) e, especialmente por causa disso, me afastei da participação eclesial cotidiana. Aprendi, entre muitas outras coisas, que a caridade individual, embora necessária, pode ser inútil se não mudarmos as estruturas que produzem mais fome e mais miséria. Muitos dos valores assimilados na época que eu iniciei minha militância são importantes até os dias de hoje. Foi a convivência com a diversidade e com a democracia que me animaram a retomar a vida na comunidade de fé. É a certeza de que a luta contra as injustiças é um compromisso cristão e católico que me incentivam a continuar sendo militante.