segunda-feira, 12 de março de 2018

Encontros, conversas, seletividade e golpismo

Parceria - O presidente ilegítimo se encontrou, neste final de semana, com a presidenta do Supremo Tribunal Federal, para uma conversa pessoal de conteúdo ainda desconhecido. Acusado por crimes de corrupção, Michel Temer pode ter conversado com Carmen Lúcia sobre os seus processos, mas o papo pode ter tido, como conteúdo, alguns objetivos e reflexões mais gerais da dupla. Não está descartada a possibilidade de terem conversado sobre o futuro, uma vez que é certo que ele será processado depois do final do seu mandato. Também é provável que o encontro tenha servido para reforçar a parceria golpista, e afastar qualquer possibilidade de que as eleições presidenciais de outubro possam ser disputadas pelo presidente Lula, o candidato mais viável eleitoralmente que defende um programa democrático e popular para o país.

Pretensa normalidade - O encontro poderia ser considerado normal se vivêssemos uma situação de normalidade democrática. Ambos são chefes de poderes constituídos, e não haveria nenhum mal na conversa institucional. Mas a situação excepcional pode encobrir objetivos escusos do encontro. O presidente ilegítimo não é somente um usurpador do cargo que ocupa sem ter obtido nenhum voto. Ele e sua equipe são acusados e suspeitos de crimes de corrupção e, por causa dessas acusações, ele é investigado no STF. O encontro entre o presidente ilegítimo e a ministra do Supremo Tribunal Federal, neste caso, tomou ares de conluio golpista. Pegou mal, inclusive para os apoiadores do golpe de 2016. No entendimento de um articulista da mídia tradicional "Carmen Lúcia deveria conversar com o espelho antes de receber investigados em casa".   

Corrupção - Não sou adepto da priorização da pauta sobre corrupção. Ao longo da história brasileira, sempre que prevaleceu, esse tema serviu para criminalizar partidos de esquerda e movimentos sociais populares e, ao mesmo tempo, foi útil para decretar a impunidade de integrantes das classes dominantes. A seletividade nos ataques ao PT e à esquerda são visíveis na atual conjuntura. O encontro do presidente ilegítimo com a ministra do STF pode ser utilizado para reforçar essa seletividade e, ao mesmo tempo, para assegurar a impunidade de Michel Temer e de integrantes do governo sem voto. Quando da sua posse na presidência do STF, Carmen Lúcia fez questão de cumprimentar, em primeiro lugar, o "povo brasileiro" e se recusou a observar o protocolo que determina que seja citado, primeiramente, o presidente da república. Não se sabe se ela teve esse objetivo, mas, na época, ela reforçou, com sua atitude, o movimento "Fora Temer". 

Luta ideológica

Comunicação e realidade - Entendimentos, disseminados pela mídia tradicional, são responsáveis pelo crescimento de um senso comum de interesse das classes dominantes, sempre em conformidade com a ideologia conservadora. Não é raro, na história brasileira, a atribuição de baderna e confusão a movimentos sociais populares. Greves urbanas já foram acusadas de serem causadoras de desemprego em massa; ocupações rurais foram criminalizadas pelos grandes veículos de comunicação; e ocupações urbanas foram apontadas como ações criminosas, e tiveram seus motivos e razões ignorados. O pensamento conservador não conseguiu, contudo, legitimar situações salariais insuportáveis e injustas, como contrapartida da alta lucratividade de empresas e negócios; concentrações de propriedades rurais improdutivas injustificáveis, como consequência da multiplicação de trabalhadores rurais sem terra para plantar; e a existência de imóveis urbanos desocupados e vazios, enquanto aumenta a quantidade de pessoas que não têm onde morar.

O elogio da riqueza - Um aspecto puramente ideológico do entendimento midiático se refere à riqueza de povos e países. A recente divulgação de números do crescimento econômico brasileiro esteve longe de destacar o enriquecimento individual de algumas poucas pessoas e a alta lucratividade de determinados setores da economia de nosso país. Para reforçar a importância do capitalismo liberal, os grandes veículos de comunicação divulgam, frequentemente, imagens felizes de moradores dos Estados Unidos da América do Norte e da Europa, sempre apresentados como países ricos. Na interpretação dos grandes veículos de comunicação, nesses lugares não existem situações de miséria nem moradores de rua. Ao fazer o elogio da riqueza, a mídia tradicional busca reforçar, na opinião pública, o entendimento de que a pobreza só pode ser fruto da desídia, de que o enriquecimento individual só pode acontecer através do empenho pessoal e de que a pobreza e a miséria não existem. .

Justiça e inclusão social - A paisagem real, no entanto, não corresponde ao pensamento midiático capitalista. O crescimento econômico só é possível por causa da crescente miséria de milhões de pessoas; os lucros do agronegócio só são viabilizados porque existem milhões de trabalhadores rurais sem terra; e a alta lucratividade dos negócios imobiliários é arrancada às custas da especulação imobiliária. A solidariedade humana é responsável por diminuir o sofrimento de milhões de pessoas, mas essas ações individuais não conseguirão, nunca, eliminar desigualdades e injustiças. Mudanças estruturais urgentes, uma luta permanente de mulheres e homens, podem instituir um mundo mais fraterno e mais justo e, finalmente, estabelecer uma organização social em que haja, efetivamente, justiça e inclusão social.   

sexta-feira, 9 de março de 2018

Enfrentamento de classe

Volta ao passado - O discurso político que acompanha o projeto presidencial do deputado federal Jair Bolsonaro tem conteúdo que vai muito além da defesa de soluções bélicas para os problemas brasileiros. A simpatia que ele tem no eleitorado, responsável por um percentual de votos que se aproxima de 20%, é potencializada por ideias que aumentaram de volume, recentemente, na sociedade brasileira. Entre essas ideias estão as defesas da diminuição da maioridade penal, da criminalização da interrupção da gravidez em todas as situações (mesmo em casos de estupro), da punição exemplar do consumo de drogas entorpecente e da proliferação do uso de armas como forma de defesa pessoal. O sucesso eleitoral de Bolsonaro, apontado pelas pesquisas, não é um fator que se restringe ao pleito presidencial, mas um conjunto de ideias que contrariam avanços civilizatórios já alcançados pela humanidade.

Interesse de classe - Não existem números precisos disponíveis, mas é óbvio que apoiadores de Bolsonaro também são defensores do presidente ilegítimo e do governo sem voto. Parlamentares que formariam uma (improvável) base de apoio do candidato direitista também são favoráveis a medidas supressivas de direitos propostas pelo golpismo. Eles também são defensores ferrenhos da privatização de ativos públicos, especialmente por causa da defesa enfática do equilíbrio das contas e dos interesses de banqueiros e de outros detentores de títulos da dívida pública. O bloco, que deve se unir em torno de Jair Bolsonaro, tem um programa político claramente de direita, alinhado com os interesses das classes dominantes e do golpismo.

Oposição - A contraposição ao exército conservador de Bolsonaro só pode ser feita, de maneira adequada e eficaz, por uma frente de esquerda, que reúna todos os lutadores por direitos sociais populares e todos os defensores da inclusão social. O conjunto dos democratas e progressistas, portadores de um conteúdo que incorporou os avanços da civilização humana, também deve reforçar a aliança para o enfrentamento eleitoral e político contra ideias e propostas que têm a pretensão de decretar uma indesejável e trágica volta ao passado. O enfrentamento deve ultrapassar o período eleitoral para se tornar um movimento permanente em defesa dos avanços sociais, da civilização humana e de uma sociedade justa e igualitária. 

quarta-feira, 7 de março de 2018

Lutando e ensinando a lutar

Conteúdo anti-golpista - O país vive uma conjuntura desfavorável para o pensamento socialista e libertário. A situação é tão complicada que a própria democracia formal, mesmo com todos os seus limites e restrições, corre riscos. A ofensiva golpista não é dirigida somente ao presidente Lula ou ao PT. O que as classes dominantes pretendem é suprimir direitos conquistados e legitimar atrasos que são contrários aos avanços da civilização humana. As conjunturas difíceis, no entanto, sempre tiveram a presença forte das mulheres na frente das batalhas em defesa da democracia e dos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras. As manifestações do dia 8 de março de 2018 vão se revestir de um conteúdo mais incisivo, contra o golpe e a favor da democracia e, especialmente, em defesa dos direitos dos trabalhadores e da maioria da população. 

Boas companhias - Tenho o orgulho de ter, na minha vida e ao meu lado, na luta por um mundo melhor e mais justo, a presença de mulheres fortes e aguerridas. E é com estas boas companhias que eu aprendo, todos os dias, lições que vão durar a minha vida inteira, e que vão reforçar a resistência aos golpes que sofrermos. Aprendi, muito especialmente, que a luta das mulheres não é (nem nunca foi) contra os homens, mas sempre foi (e sempre será) uma luta contra a sociedade capitalista, que produz injustiças aos montes e que pretendeu calar a voz daquelas que nunca se renderam. Neste dia 8 de março, essas lutadoras estarão concentradas, a partir das 16 horas, na Praça Osvaldo Cruz, que fica no encontro das avenidas Paulista e Treze de Maio. As manifestantes vão se dirigir, em passeata, pela Avenida Paulista, onde será celebrada a coragem de todas as mulheres que sempre tiveram a ousadia de lutar por um mundo melhor e mais justo. Estarei presente na concentração e na caminhada das companheiras, juntamente com todas as pessoas que se opõem ao golpismo e que defendem a democracia. 

terça-feira, 6 de março de 2018

Transporte público e periferia

Mudanças anunciadas - A prefeitura de São Paulo pretende anunciar, nos próximos dias, uma série de mudanças nas linhas de ônibus que servem a periferia da cidade. As modificações seguem a lógica da gestão eficiente, mas as extinções de linhas e trajetos vão prejudicar a maioria da população da periferia. Na região sul de São Paulo, por exemplo, os moradores da região do Parque Residencial Cocaia, que se utilizam da linha que vai até a Avenida Vicente Rao (na região do Brooklin) que, hoje, usam somente um ônibus, terão que se dirigir, primeiramente, ao Terminal Grajaú, para, de lá, embarcar em um novo ônibus até o seu destino. O mesmo trajeto, hoje feito através de um único ônibus, será feito com a utilização de duas conduções, o que deve resultar em mais espera nos pontos de parada e, em mais demora nos deslocamentos. Na prática, os que fazem esse trajeto terão que acordar mais cedo e chegarão em casa mais tarde.

Sem risco - Os cortes e extinções têm o objetivo de tornar  mais atrativo o negócio para investidores privados, às vésperas de uma nova licitação para o transporte público na maior cidade do país. O pagamento regular de subsídios públicos já é um atrativo importante para as empresas do setor, mas o prefeito tucano pretende tornar o negócio ainda melhor para os investidores. A extinção de linhas e trajetos vai piorar as condições para os usuários do transporte público e pode provocar a demissão imediata de cerca de cinco mil trabalhadores. A lógica da medida é incrementar o "capitalismo sem risco" já existente. Com a entrada em vigor das mudanças, a lucratividade das empresas de transporte público (que já não é pequena), pode se tornar enorme.

Contramão - Com a extinção de linhas e trajetos, o prefeito tucano pretende reduzir a frota em mais de mil veículos. Agindo assim, a decantada eficiência de gestão atua na contramão da lógica urbana, que prevê o aumento da oferta de transporte público e da consequente redução do uso de veículos individuais. Com a extinção de linhas e trajetos, o prefeito tucano pretende incentivar o uso de carros particulares e penalizar a população mais carente. Para dar um aspecto democrático às medidas, o prefeito promoveu, através da internet, uma consulta pública que não teve participação significativa da população. Pouco mais de mil e quinhentas pessoas participaram da consulta pública proposta pelo mandatário municipal, que foi encerrada nesta última segunda feira (dia 5 de março). Os que discordam das medidas, no entanto, ainda têm tempo para apresentar sua opinião, e isso pode ser feito através de abaixo assinado contra as mudanças propostas pelo prefeito. A discordância pode ser manifestada através do link http://www.peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR104383.

segunda-feira, 5 de março de 2018

Disputa programática

Fator Bolsonaro - O modelo da democracia brasileira, mantido, em sua essência, há décadas, privilegia a fulanização do voto e despreza o debate sobre conteúdos programáticos. A proporcionalidade das casas legislativas, por outro lado, assegura a presença de representantes de ideias e projetos que não são reconhecidos pela maioria da sociedade, mas que se manifestam de acordo com os interesses de seus apoiadores políticos e financeiros. As ideias defendidas por Jair Bolsonaro não são majoritárias, mas há uma parcela importante da população que pensa como ele, fazendo com que venha se elegendo, sucessivamente, para o cargo de deputado federal. Numa eleição presidencial, no entanto, ele deve ter dificuldades. Mas é assustador o percentual de pessoas que se dispõe a votar nele e a apoiá-lo em seu objetivo de tornar-se presidente da república. Mesmo que não se eleja, é provável que ele obtenha, no primeiro turno, um resultado próximo de 30%, o que será uma proporção muito elevada. Será a primeira vez que uma candidatura, abertamente, de direita alcançará tal resultado, e o percentual pode levá-lo ao segundo turno, quando o voto é decidido mais pela negação das ideias e propostas do oponente do que pelo conteúdo programático do escolhido. Collor, por exemplo, não foi eleito por causa dos seus projetos, mas, essencialmente, porque ele era o candidato que podia, em 1989, derrotar a candidatura de esquerda encarnada pelo presidente Lula. 

Pensamento único - Partidos políticos de esquerda têm sido hostilizados por não apoiarem, já no primeiro turno, a candidatura do presidente Lula. As hostilidades são dirigidas ao PCdoB, que tem Manuela D'Ávila como candidata; e ao PSOL, que acaba de lançar a candidatura de Guilherme Boulos, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Como petista, sou defensor confesso da candidatura do presidente Lula. Continuo firme na luta pelo direito de o presidente Lula concorrer a um novo mandato. Acho um exagero, no entanto, qualificar integrantes do PCdoB e do PSOL como traidores. Considero positivas as outras candidaturas da esquerda brasileira ao Palácio do Planalto, e acho que a soma dos votos desses postulantes com os votos do presidente Lula podem representar um capital eleitoral importante no momento de discutirmos do futuro do Brasil. A diversidade, que sempre esteve presente nas lutas sindicais e populares, se prepara para ingressar no espaço institucional, o que deve dar conteúdo classista à disputa eleitoral, ainda dominada por golpistas e seus apoiadores ou por defensores confessos de ideias conservadoras. A construção da unidade da esquerda deve ser resultante da aproximação dos que pensam diferente mas que, ao mesmo tempo, defendem uma sociedade justa e igualitária. 

A defesa da segurança - O presidente ilegítimo busca conseguir a simpatia da população com a intervenção federal militar no Rio de Janeiro, mas a tarefa não é simples. Medidas bombásticas, como a intervenção, podem não fazer efeito imediato, e Michel Temer precisa de apoio urgente para seguir governando o país. Combater a violência só é possível com a adoção de medidas que extrapolam o sistema localizado de segurança pública. O aumento de investimentos públicos em educação e saúde tiraria as pessoas pobres da influência do tráfico de drogas e do crime organizado; a descriminalização do uso de drogas hoje consideradas ilícitas eliminaria um negócio rentável para os traficantes; e o fortalecimento da fiscalização das fronteiras poderia impedir a entrada de armas de guerra. A adoção dessas medidas, no entanto, batem de frente com os objetivos do golpismo. A economia de recursos públicos, para atender o mercado financeiro, deve penalizar os setores de saúde e educação; o governo sem voto precisa do apoio de parlamentares que defendem a criminalização de usuários e uma espécie de abrandamento tácito em relação a traficantes; e a presença de forças militares nas fronteiras do país também será diminuída por causa do corte de gastos públicos federais.

sábado, 3 de março de 2018

Racismo e vingança

Preconceito racial - A detenção de um ator global é uma demonstração do racismo ainda existente em nossa sociedade. Darlan Cunha foi abordado, numa vistoria "de rotina" por causa da cor da sua pele. Ainda que tenha sido descoberta uma ordem de prisão contra ele, se fosse um "branco caucasiano", é provável que ele não teria sido submetido à revista ou à consulta aos arquivos policiais. Diariamente, jovens negros e pobres são abordados, presos e assassinado, e o fato de serem pessoas anônimas, contribui para que o fato lamentável nem chegue ao conhecimento da opinião pública. Darlan é acusado de ter agredido uma ex-namorada. A acusação contra ele foi feita em 2013, e foi retirada pela acusadora uma semana depois. Como a queixa foi feita com base na Lei Maria da Penha, a acusação não pode ser retirada, nem pela própria vítima.

Acusação mentirosa - O vendedor Atercino Ferreira de Lima Filho foi libertado da prisão, nesta sexta feira (2 de março), depois de ficar quase um ano preso, acusado de abusar sexualmente dos filhos. A acusação aconteceu em 2002. A decisão judicial sobre a soltura só foi possível por causa da reformulação dos depoimentos de seus filhos, que declararam, em novo depoimento, que "nunca sofreram abusos" e que foram "obrigados pela mãe a acusar o pai". A mentira, no caso, foi responsável pela prisão de Atercino, o que pode prejudicá-lo pelo resto da vida. Apesar da sua soltura, ele sempre vai conviver com o estigma dos maus tratos de que foi acusado. Não há indícios de que a vingança, motivada por um processo de separação, seja punida.

Civilização humana - A suspeição de negros e a culpabilidade individual de acusados de qualquer tipo de crime são atentados graves contra avanços civilizatórios importantes. Darlan Cunha pode não ser culpado das acusações que lhes foram dirigidas, mas foi abordado por causa da cor de sua pele; e Atercino Ferreira de Lima Filho ficou quase um ano preso, acusado de um crime que não cometeu. É urgente que saibamos superar, na prática, o racismo ainda existente na sociedade brasileira, e que, também, possamos restabelecer um ambiente jurídico em que acusados e suspeitos são inocentes até que sejam provadas suas culpas, sem qualquer tipo de dúvida. Permitir que fatos como esses se repitam pode significar a consagração do racismo e da vingança.  

O futebol e a defesa da vida

Espetáculos - Sempre gostei de ir a estádios de futebol. As torcidas sempre me fascinaram. Mais do que as disputas das partidas, as cenas d...